A Quinta de Paços é uma empresa familiar detida pela mesma família há mais de 500 anos que explora um património agrícola de 200 hectares, dos quais cerca de 20 ha de vinhas. Procura produzir vinhos de alta qualidade com uma personalidade distinta, colocando um especial ênfase no seu caracter natural e autêntico. As suas duas principais explorações são a Quinta de Paços (Barcelos) e a Casa do Capitão-mor (Monção). Paulo Ramos é um dos rostos por trás do projecto, em conjunto com o seu pai.. Natural do Porto, mas minhoto de coração, licenciado em Relações Internacionais. Vive entre o Porto e Barcelos.
Olá Paulo, o que consideras diferenciador nos vinhos da Casa de Paços? O nosso lema é fazer “Vinhos autênticos com uma personalidade distinta”. Aliamos isso a alguma inovação, como termos sido um dos pioneiros no uso de barricas na fermentação e estágio de técnicas como a batonnage na região ainda nos anos 90. Fizemos, em 1996, o primeiro lote de Alvarinho e Loureiro na região, agora muito em voga. Mas o nosso ainda é diferenciado por ser um blend de Alvarinho de Monção com Loureiro de Barcelos. Fazemos um monocasta de Fernão Pires no Minho, e um vinho verde Loureiro “novo” para o Japão. Este ano teremos algumas novidades de que falaremos mais à frente.
E na região dos Vinhos Verdes? Nós produzimos vinho desde o séc. XVI e ganhamos prémios internacionais (1876, EUA dos vinhos de Barcelos e em 1888 na Alemanha dos vinhos de Monção) antes de sequer existir a designação “Vinho Verde”. Esta é das poucas regiões que adoptam uma designação de um tipo/perfil de vinho por oposição a um nome de um território. Isto ainda é difícil de explicar a muitos estrangeiros. Na DOC Vinho Verde, o que se tem proposto é um conceito de vinho leve, jovem, para beber cedo, que é a antítese da maior parte dos vinhos da Quinta de Paços. Os vinhos verdes têm uma boa notoriedade e posicionamento claro em muitos mercados, mas que leva a que se esperem da região, vinhos baratos de consumo rápido. Isso torna-os perigosamente próximos de vinhos como o Lambrusco. Seria bom vermos o que aconteceu com os vinhos brancos alemães e austríacos em termos de posicionamento de qualidade/preço para vinhos com perfis semelhantes aos nossos. O grande desafio é a criação de valor e o aumento progressivo e sustentado dos preços. Acho que a CVRVV já assumiu que esse é o caminho. Mas já existe um bom número de produtores que tentam acrescentar valor aos vinhos da região. A recente valorização da sub-região Monção-Melgaço é igualmente um excelente exemplo. Espero que possa ser esse o caminho, agora alargado às demais sub-regiões. Até porque em regiões como Bordéus, o que aparece no rótulo são as suas sub-regiões. Um Chateau Mouton-Rothschild apenas indica “Paulliac” (a sub-região) no rótulo.
Os teus vinhos assentam também em monocastas. Qual a casta rainha em Portugal, na tua opinião? Só para falar das brancas, temos várias “Rainhas” e muitas “Princesas”, mas depende da região, ou do território (ou terroir). Obviamente que em Monção-Melgaço será a Alvarinho. No resto do Minho para além desta temos a Loureiro, a Avesso em Baião, só para nomear algumas. Temos também excelentes castas como a Antão Vaz no Alentejo ou o Encruzado no Dão. Depois algumas são transversais a quase todo o país quase sempre com bons resultados como a Arinto, a Fernão Pires/Maria Gomes. Uma casta de que gosto muito e que é, por vezes, pouco valorizada é a Moscatel Galego Branco da qual vou lançar dois vinhos este ano (um branco seco e uma vindima tardia). Vão ter de sair com selo do IVV porque, apesar de ser uma casta portuguesa, não é admissível nem para “Vinho Regional Minho” (enquanto que a Sauvignon Blanc e a Semillon são permitidas).
Os teus vinhos são quase todos gastronómicos, sem gás e com uma acidez elevada. Belos brancos. Como coabitam numa região que produz também vinhos fáceis, leves e por vezes muito baratos? Por vezes com dificuldade. Tentamos explicar que são “verdes” diferentes, com outra abordagem. Por isso classificamos muitos dos vinhos que até podiam ser “DOC Vinho Verde” como “Vinho Regional Minho”. A questão do gás é das poucas coisas em que não transijo. Já nos anos 70 os nossos vinhos que eram feitos para consumo familiar não tinham gás. Adicionar gás artificial é que não faz sentido para nós. Em relação à acidez dos nossos vinhos, esta até nem pode ser considerada elevada. Os nossos vinhos andam entre os 5.5g a maior parte anda nos 6.5g e é raro ultrapassarem os 7g de acidez fixa. Temos inclusive vinhos com uma acidez mais baixa, como o Fernão Pires, dirigido para um mercado que prefere vinhos mais macios. Até porque existe a falsa noção que os vinhos verdes são muito ácidos, o que já não é assim. Temos sim é características de frescura e mineralidade dadas pelos solos graníticos (ricos em quartzo em Barcelos e de Calhau rolado em Monção). Os nossos vinhos são gastronómicos, e pensados enquanto tal. A maior parte do consumo de um vinho ainda é feito para acompanhar uma refeição. Mas também fazemos uma linha de vinhos que se bebem bem sozinhos, como o Rosé, o Fernão Pires, e o a que chamamos o Loureiro “Novo”. Este vinho foi feito inicialmente só para o Japão para chegar lá na altura do Beaujolais Nouveau, e que sido agora alargado a outros mercados.
O que gostas de fazer nos tempos livres? Responder a perguntas interessantes como estas sobre os nossos vinhos (aqui estou a dar graxa ;-) . Mas igualmente sou um melómano e cinéfilo e também adoro ler romances (por oposição ao que tenho de ler para preparar aulas).
Se tivesses possibilidade de jantar com uma personalidade, levando um vinho dos teus, quem seria? Talvez o Francis Ford Coppola, assim falava de vinho e de cinema ao mesmo tempo (e a ver se me dá dicas de como passar de produtor de vinho/professor universitário a realizador de cinema).
Qual o melhor vinho que alguma vez provaste? É sempre difícil dizer. Os que bebi enquanto adolescente que me marcaram: Barca Velha ou Vega Sicilia Único. Nos finais dos anos 90 fui algumas vezes com o meu pai à Vinexpo em visita de estudo só para provar coisas diferentes e abrir horizontes. Depois tenho a sorte de, na Pós-Graduação em Enologia da UCP-ESB onde dou aulas, me “colar” às sessões de provas do meu colega e amigo Bento Amaral onde se provam coisas muito interessantes.
Bebes vinho de outras regiões? Não sou “enoxenófobo”. Bebo sobretudo para experimentar coisas diferentes, não só de Portugal, mas também estrangeiros.
Conta-nos uma peripécia que tenhas vivido no mundo dos vinhos. A minha iniciação ao mundo do álcool. Foi feita pelo meu padrinho e tio-avô, que era o dono da Quinta de Paços, que me disse para molhar o dedo e provar a aguardente acabada de destilar. Obviamente não quis dar parte de fraco, fiz uma expressão de satisfação, e tentei logo voltar a molhar o dedo… mas ouvi logo um “nem penses!!!”. E nem vou revelar que idade tinha.
Momento: Refere uma música preferida; local de eleição e companhia; e claro vinho a condizer. Música: não consigo escolher uma, gosto demasiado de música para escolher só uma. Local: na Quinta de Paços. Companhia: família e amigos e convidados nossos. Vinho: os meus porque é sempre bom poder explicar a abordagem por detrás de cada um deles e ouvir a opinião sobre os mesmos.
O vinho verde é só para beber no Verão ;-) ? O “Verão” é quando o homem quiser… Mas bebam Vinho Verde, Vinho Regional Minho, Monção-Melgaço, Cávado… Quando lhes apetecer e souber bem, e com a comida que acharem melhor!
Sérgio Lopes
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