Quando começamos a estar
convencidos de saber alguma coisa sobre uma determinada região vínica, e digo
região, pois nem por momentos me atreveria a pensar isso sobre o vinho em
geral, eis que aparece um vinho à minha frente e me deixa siderado! Chablis e
Sauvignon num mesmo rótulo?! Como é possível? É exatamente isto que torna este
mundo dos vinhos tão maravilhoso, a enormidade de pequenas exceções como esta que
nos deixa sempre surpreendidos e excitados.
Para perceberem o meu espanto têm
de saber que a Borgonha em termos de castas brancas trabalha, quase em
exclusivo, com a casta Chardonnay e que Chablis é talvez a sua sub-região mais
famosa, mesmo não sendo a que produz os mais caros e conceituados vinhos desta
casta na região. A fama vem-lhe curiosamente do novo mundo, em particular da
América do Norte, onde o nome Chablis foi e ainda é usado para designar um
vinho branco e seco de uma qualquer casta e que paradoxalmente nada se parecem
com os vinhos de Chablis, quase impossíveis de replicar naquelas latitudes,
pois são vinhos metálicos e minerais com uma acidez vibrante e cortante.
Apesar de a palavra Chablis não
aparecer de uma forma ostensiva, está apenas numa espécie de selo no topo da
garrafa, pensei que seria impossível ela aparecer em simultâneo com a palavra
Sauvignon. Não é! E realmente não lhe é dado grande destaque que vai inteirinho
para Saint-Bris o nome desta pequena AOC (similar ao DOC português), tendo
ganho esse estatuto apenas em 2003. Era uma VDQS (similar à VQPRD) desde 1974
usando os vinhos a designação de Sauvignon de Saint-Bris. Uma designação
ajustada pois, na minha investigação, descobri que nesta região se pode usar
Sauvignon Blanc e Sauvignon Gris, uma mutação da primeira e que adiciona algum
peso ao vinho. Descobri também a origem desta singularidade que vem já de
tempos antigos, uma vez que até meados do século XIX a casta dominante era a
Roublot, atualmente extinta, dizimada pela filoxera e não replantada depois por
ser demasiado suscetível à doença.
Por tal foi, então, substituída pelas
Sauvignon, muito provavelmente por causa do sucesso conseguido em regiões não
muito longe dali, nos inícios do rio Loire, as agora famosas regiões de
Sancerre e Pouilly-Fumé, que originam um vinho mais intenso e mineral que
aquele que acabei por poder provar graças ao amigo Cupido, nome apropriado para
nos dar a conhecer novos amores, o William Fevre Saint-Bris Sauvignon 2007, que
apesar da idade se mostrou ainda perfumado e vegetal, num estilo muito francês,
mas menos intenso e agressivo que o normal. Muito agradável e aconselhável.
Estava, no entanto, contente por
isto não contrariar o que tenho dito nos meus cursos, ou seja, que se
encontrassem a palavra Bourgogne num vinho branco, então a casta seria
obrigatoriamente Chardonnay. Bom, parece que isso só será verdade em 99,99% dos
casos uma vez que consegui encontrar um rótulo que continha a maldita palavra,
foi apenas um, mas é o suficiente para me contradizer. Chatice, pois lá terei
de pedir desculpa a todos os meus alunos, felizmente muitos e bons, começando
por o fazer aqui. Me desculpem.
Hildérico Coutinho (Escanção / Sommelier)
Caro Hildérico Coutinho! Aproveitando a minha visita aqui à Borgonha tenho boas notícias para si. De facto, Chablis é 100% Chardonnay. O que provou foi um vinho de Saint Bris que onde produzem aqui os vinhos de Sauvignon Blanc.
ResponderEliminarAssinado: Pedro Mesquita.
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ResponderEliminarSim, só que Saint-Bris é em Chablis!! E pior, a palavra Chablis pode aparecer em rótulos de Saint-Bris. Por isso a minha estupefação!
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