A gastronomia da Bairrada, associada
à restauração, nasce no início dos anos 40, do século XX. Desde então,
centrou-se no Leitão Assado e, os últimos 70 anos, têm sido benfazejos para
esta iguaria que deu fama e fortuna à região. Em todo este período assistimos
ao nascimento de dezenas de restaurantes que todos os anos serviam, em
travessas de alumínio, milhares de quilos dum produto gastronómico que é
soberbo e, muitas vezes, tratado com algum desprezo. A arte de servir à mesa
era também praticada por autodidactas que, começando na cozinha, iam ganhando
estatuto, e, com o diploma da quarta classe debaixo do braço,, aprendiam os
truques do serviço e, entre umas graçolas, lá iam servindo os clientes que ali
estavam sobretudo pelo belo e reluzente bácorozinho.
E esta cruel realidade foi
coexistindo com a região durante décadas sem que mais fosse exigido. Aliado à
gastronomia, também os vinhos da Bairrada foram durante décadas tratados como
mendigos, parentes pobres doutras regiões mais nobres e de melhor pedigree.
Há, no entanto, uma nova
realidade a despontar timidamente e que promete revolucionar a gastronomia da
região. E os vinhos parecem ser a alavanca que faltava para esta mudança que é,
a todos os níveis desejável. Convenhamos, a Bairrada não é, nem pode ser,
somente o Leitão. Encontrarmo-nos no centro do país, estamos dotados de óptimas
acessibilidades rodoviárias e , do topo do Bussaco, avistamos um mar atlântico
que nos permite usufruir do melhor pescado do Mundo. Nada nos pode limitar.
A somar às condições estruturais,
possuímos hoje vinhos tecnicamente irrepreensíveis, oriundos dum terroir
distinto que nos traz tintos, brancos, rosados, espumantes, abafados,
licorosos, aguardentes, colheitas tardias, ou seja, uma imensidão de néctares que
pedem notoriedade. E o melhor palco para actuarem tem necessariamente que
passar pela restauração que, naturalmente, terá que se reinventar.
A reinvenção da Bairrada já se iniciou
e os seus protagonistas, ainda com os receios naturais de quem está a sair da
sua zona de conforto, assumem o risco de dar esses primeiros passos.
No dia 11 de Março, coube ao
restaurante Pedro dos Leitões dar um passo firme na direcção desta nova
Bairrada, ousando duplamente: saiu do seu core business, harmonizando uma
gastronomia que privilegiou a terra e o mar com os vinhos oriundos dum Alentejo
mais irreverente; e teve a ousadia de convidar 3 alunos da Escola de Hotelaria
de Coimbra para coordenar e reger uma cozinha que carrega o pioneirismo. E foi
uma aposta duplamente.
Em breve, um retrato minucioso do
jantar vínico que aliou a nova cozinha do Pedro dos Leitões com os vinhos
audazes de Tiago Cabaço Winery.
Miguel Ferreira (A Lei do Vinho)
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