segunda-feira, 13 de março de 2017

Opinião: Uma nova Bairrada

A gastronomia da Bairrada, associada à restauração, nasce no início dos anos 40, do século XX. Desde então, centrou-se no Leitão Assado e, os últimos 70 anos, têm sido benfazejos para esta iguaria que deu fama e fortuna à região. Em todo este período assistimos ao nascimento de dezenas de restaurantes que todos os anos serviam, em travessas de alumínio, milhares de quilos dum produto gastronómico que é soberbo e, muitas vezes, tratado com algum desprezo. A arte de servir à mesa era também praticada por autodidactas que, começando na cozinha, iam ganhando estatuto, e, com o diploma da quarta classe debaixo do braço,, aprendiam os truques do serviço e, entre umas graçolas, lá iam servindo os clientes que ali estavam sobretudo pelo belo e reluzente bácorozinho.

E esta cruel realidade foi coexistindo com a região durante décadas sem que mais fosse exigido. Aliado à gastronomia, também os vinhos da Bairrada foram durante décadas tratados como mendigos, parentes pobres doutras regiões mais nobres e de melhor pedigree.

Há, no entanto, uma nova realidade a despontar timidamente e que promete revolucionar a gastronomia da região. E os vinhos parecem ser a alavanca que faltava para esta mudança que é, a todos os níveis desejável. Convenhamos, a Bairrada não é, nem pode ser, somente o Leitão. Encontrarmo-nos no centro do país, estamos dotados de óptimas acessibilidades rodoviárias e , do topo do Bussaco, avistamos um mar atlântico que nos permite usufruir do melhor pescado do Mundo. Nada nos pode limitar.

A somar às condições estruturais, possuímos hoje vinhos tecnicamente irrepreensíveis, oriundos dum terroir distinto que nos traz tintos, brancos, rosados, espumantes, abafados, licorosos, aguardentes, colheitas tardias, ou seja, uma imensidão de néctares que pedem notoriedade. E o melhor palco para actuarem tem necessariamente que passar pela restauração que, naturalmente, terá que se reinventar.

A reinvenção da Bairrada já se iniciou e os seus protagonistas, ainda com os receios naturais de quem está a sair da sua zona de conforto, assumem o risco de dar esses primeiros passos.

No dia 11 de Março, coube ao restaurante Pedro dos Leitões dar um passo firme na direcção desta nova Bairrada, ousando duplamente: saiu do seu core business, harmonizando uma gastronomia que privilegiou a terra e o mar com os vinhos oriundos dum Alentejo mais irreverente; e teve a ousadia de convidar 3 alunos da Escola de Hotelaria de Coimbra para coordenar e reger uma cozinha que carrega o pioneirismo. E foi uma aposta duplamente.

Em breve, um retrato minucioso do jantar vínico que aliou a nova cozinha do Pedro dos Leitões com os vinhos audazes de Tiago Cabaço Winery.

Miguel Ferreira (A Lei do Vinho)

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