Já diz o ditado popular mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, isto é, a passagem do tempo vai-nos encarregando de moldar (afinar?) as nossas preferências, ao longo dos anos. E isto também se aplica ao vinho. A vida é feita de ciclos e de modas e olhando para trás no tempo, recuando – nem será necessário mais do que 10 anos - muita coisa mudou no perfil dos vinhos e do consumidor. E eu também mudei. Quando comecei a gostar realmente de vinho estavam na moda os tintos perfilados bombas alcoólicas e com passagem por madeira em fartura. Poder, concentração, ou fruta sobre maturada eram marcadores evidentes. Confesso que com o tempo fui progressivamente me afastando desse perfil, apaixonei-me, entretanto, pelo vinho branco e virei brancófilo… Mas sobre os brancos falaremos noutra crónica pois também evoluíram e mudaram de perfil bastante nos últimos 10 anos.
Voltando aos tintos, na primeira década deste século, vivíamos uma época em que Robert Parker, um dos mais proeminentes críticos de vinhos, entre outros, tinha alguma preferência na defesa desse perfil mais concentrado dos vinhos e consequentemente o consumidor ia um pouco atrás. Hoje até Robert Parker procura mais elegância, menos extração, menos madeira e menos álcool – tintos que deem prazer a beber e que sejam bons companheiros à mesa, com acidez suficiente para fazer brilhar o prato, mas sem se sobrepor. Qual é a lógica de beber uma bomba alcoólica e cheia de madeira, acompanhando por exemplo um assado? Não faz sentido a combinação de uma comida mais pesada com um vinho também ele concentrado, creio eu.
O paradigma da elegância
Nos anos mais recentes tem
crescido a aposta por parte quer dos produtores mais clássicos, quer de
produtores mais recentes no lançamento de vinhos mais elegantes e com menos álcool.
Com menos corpo também é certo, mas com muito sabor. E tem sido um pouco
transversal a todas as regiões. Não sendo ainda evidente a mudança, é
claramente uma tendência. Vinhos como o
Quinta da Carolina 2015 do Douro, o Quinta das Bageiras Garrafeira ou Luis Pato
Vinha Barrosa – ambos da Bairrada ou até mesmo os tintos da Quinta do Mouro, do
Alentejo, todos se mostraram com menos extracção, menos utilização de madeira, elegantes
e com uma belíssima acidez. 3 regiões icónicas de Portugal a apresentarem
vinhos neste estilo, provados na última edição do simplesmente… Vinho, no final
de Fevereiro.
Os meus destaques
Mas há mais protagonistas que
merecem destaque no que toca a este perfil de vinhos tintos, desde logo o
enólogo Luis Seabra cujo seu projeto
pessoal Xisto Cru / Xisto ilimitado, bem como o apoio que presta em Muxagat, ao
projeto Pormenor de Pedro Coelho e na Quinta da Costa do Pinhão resultam em
vinhos num estilo Duriense fora do comum, muito mais focado na pureza, pouca
extracção e muita elegância e frescura; na Bairrada Luis Gomes e o seu projeto Giz, de onde sobressai o aveludado e
cheio de classe tinto Vinha das Cavaleiras; o enólogo Paulo Nunes que na Casa da Passarela (Dão) ou mais recentemente na
histórica Casa de Saima (Bairrada) imprime o seu cunho muito pessoal
respeitando o terroir de cada casa e intervindo de forma minimalista; Ainda no Dão, António Madeira, urge descobrir.
Luis Leocádio, na Quinta do Cardo
(Beira Interior), mas também no seu projeto pessoal Titan of Douro –
obrigatório conhecer o trabalho deste jovem e talentoso enólogo; Da Beira Interior, atenção ao projecto Vinha da Ordem, de uma vinha centenária (para além do tinto, há um palhete deliciosso); Vitor Clara e o seu Dominó, tintos do
Alentejo, totalmente fora da caixa; Até na região dos vinhos verdes aparecem
vinhos tintos neste estilo, de projetos de Constantino
Ramos (Pardusco / Zafirah) ou Márcio
Lopes, com o seu Pequenos Rebentos Atlântico. Entre tantos outros, que vão emergindo
Um brinde à elegância e à pureza.
Uma tendência que terá vindo para ficar?
Sérgio Lopes (in Revista Paixão Pelo Vinho #77)
Sem comentários:
Enviar um comentário